Foi-se o tempo em que o roubo/furto do aparelho celular significava um mero prejuízo material, sem grandes desdobramentos, resumindo-se a preocupação da vítima ao valor do aparelho em si e ao custo de aquisição de outro. Época em que o telefone tinha como funções fazer e receber ligações, trocas de mensagens e tirar fotos.
O avanço da tecnologia impulsionou os celulares (smartphones) para outro nível, tornando-os capazes de realizar diversas tarefas, praticamente computadores de mão com acesso a aplicativos de bancos, dados e e-mails. Logo, a preocupação da vítima que tem seu aparelho subtraído aumentou diante do risco de acesso pelos criminosos às informações sensíveis e senhas.
Em razão dos dados que acessamos e armazenados nos aparelhos celulares o número de furtos e roubos vem sofrendo notável aumento. Segundo o portal G1 Globo[1], entre janeiro e abril deste ano, o número de furtos subiu 40% e de roubos 12%, quando comparado ao mesmo período de 2021.
O que fazem os criminosos?
De posse do celular desbloqueado, os criminosos agem rápido enquanto a vítima não tem tempo de informar ao banco a ocorrência para o bloqueio da conta e das operações. Nesse tempo, usam meios fraudulentos para obter a senha de bancos e passam a realizar transferências, compras com cartão de crédito cadastrado no aparelho e até mesmo empréstimos, causando enormes prejuízos às vítimas.
Postura dos bancos
Assim que as vítimas conseguem ter acesso às contas e percebem o estrago feito pelos criminosos, contestam junto aos bancos as transações realizadas com o objetivo de serem ressarcidas. Porém, acabam amargando a negativa dos bancos que afirmam não terem sido responsáveis pelo dano, tendo havido o uso de senha pessoal intransferível.
E aí? O prejuízo fica com quem?
Vítima ou banco?
Ao analisarmos recentes decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o tema, verificamos que as negativas dos bancos de não indenizar seus clientes não seguem o mesmo entendimento dos juízes, que têm condenado as instituições financeiras a indenizar seus correntistas vítimas de roubo/furto, para situações específicas e não de modo irrestrito.
Para ilustrar o entendimento dos juízes frente esse tipo de situação, trouxemos alguns trechos de uma decisão[2]:
A autora foi vítima de furto de seu aparelho celular, o qual, em posse dos criminosos, foi utilizado para fraudar sua conta bancária especificamente com a alteração de limites de crédito e a realização de empréstimos pessoais, transferências de valores e pagamentos, totalizando prejuízo de R$ 68.291,22.
Em que pese as alegações postas pelo réu (banco) em sede de razões recursais, inafastável sua responsabilidade pelas transações bancárias fraudulentamente realizadas por meio do aplicativo instalado no telefone celular furtado da autora, uma vez que, como é sabido, tal ferramenta é disponibilizada aos clientes pelas instituições financeiras para facilitar as transações bancárias, minimizando a necessidade de deslocamento até as agências.
Do mesmo modo, a natureza objetiva da responsabilidade do réu (banco), atuante no sistema bancário, impõe que ele assuma o risco inerente à tal atividade, ou seja, que garanta a segurança das operações realizadas por meios eletrônicos, assim como daquelas efetivadas no interior das agências, postos de atendimento ou caixas eletrônicos, não devendo permitir a livre ação de fraudadores.
Outrossim, apesar de o réu apontar que as transações foram realizadas mediante a utilização das credenciais pessoais e intransferíveis da vítima, bem se sabe que os sistemas eletrônicos das instituições financeiras não são à prova de falhas, devendo elas serem responsabilizadas pelos métodos de pagamentos colocados à disposição dos consumidores.
Aplicação do entendimento firmado pelo STJ, por meio da súmula 479.
Súmula 479 – As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.
Em suma, “a instituição bancária é responsável pela segurança das operações realizadas pelos seus clientes”
Em verdade, no caso dos autos, a falha na prestação do serviço bancário é inequívoca, já que a liberação das consideráveis transações bancárias objeto de discussão nos autos, efetuadas em tão curto espaço de tempo e com tamanha discrepância do perfil de consumo da consumidora correntista operações nitidamente suspeitas, deixa evidente a ausência de cautela do banco e do regular funcionamento de seu sistema interno de segurança, circunstância que, tendo possibilitado a realização de transações fraudulentas, corrobora para a responsabilização do réu pelos correspondentes prejuízos.
Conclusão
Por se tratar de relação de consumo entre cliente e banco, o Judiciário tem adotado uma postura protecionista ao cliente, que é a parte mais fraca da relação, impondo às instituições financeiras em determinadas situações a responsabilidade pelos prejuízos causados pelos criminosos. Como fundamento, os juízes apontam que houve falha na prestação de serviço com relação à segurança oferecida, que permitiu ação fraudulenta, bem como o banco não identificou e bloqueou as transações que fogem do perfil do cliente.
Você conhece alguma pessoa que foi vítima de furto ou roubo do celular e teve prejuízos com o banco?
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Nunca é demais lembrar que “cada caso é um caso” e merece análise detalhada das circunstâncias que tendem a apontar alguma responsabilidade dos bancos ou não.
[1] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2022/07/05/aumento-de-roubos-e-furtos-de-celulares-em-sao-paulo-causa-mudanca-de-comportamento-nas-ruas.ghtml
[2] (TJSP; Apelação Cível 1008007-86.2021.8.26.0564; Relator (a): Lavínio Donizetti Paschoalão; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Bernardo do Campo – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 13/07/2022; Data de Registro: 15/07/2022)
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