Em decisão recente¹, publicada em 04/10/2021, o Juiz de Direito Juan Paulo Haye Biazev, do Juizado Especial Cível de Vinhedo/SP, julgou parcialmente procedente a ação movida por um proprietário em face do condomínio que impôs multas por ter ele alugado seu imóvel para terceiros via plataforma digital – Airbnb.
Além de determinar a anulação das duas multas impostas pelo condomínio ao dono do imóvel (locador da unidade), o juiz condenou o condomínio a se abster de impor sanções ou objeções ao locador em razão das locações realizadas por meio do Airbnb ou qualquer outro meio, até que sobreviesse alteração na convenção vedando expressamente tal conduta.
Multa só por descumprimento de dever
Para o julgador, no caso em análise, seria descabida a imposição de multa, pois não houve violação legal ou da convenção condominial.
Tendo em vista que a ação do condomínio correspondente à aplicação das sanções ao morador foi fundamentada na decisão proferida pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial de nº 1.819.075/RS, dentre outros pontos indicados na sentença, o magistrado demonstrou item por item a razão pela qual o entendimento do condomínio estaria equivocado e as diferenças fáticas entre os casos que apontam o total descompasso entre o caso prático e aquele julgado pela Corte Superior.
Segundo o julgador, o STJ, no caso mencionado acima, decidiu que havendo previsão expressa de destinação residencial das unidades na convenção condominial, será ilícito seu uso para a atividade de hospedagem remunerada. Na situação específica do Rio Grande do Sul ficou claramente configurada a desvirtuação do uso residencial do imóvel, pois foi criado pelo proprietário um verdadeiro albergue no qual diversos cômodos do imóvel eram explorados de forma simultânea. Para ele, esse fato é muito distinto daquele costumeiramente observado na plataforma virtual Airbnb, onde os imóveis são oferecidos em sua totalidade, ainda que por curto período.
Devagar com o andor!
Ainda de acordo com o juiz, “equivocado afirmar que esse acórdão qualificou como atividade comercial toda e qualquer locação realizada por plataforma digital”. Pontuou algo bastante relevante ao lembrar que o ministro do STJ deixou claro que o resultado do julgamento não seria diferente se o anúncio da locação tivesse sido feito por jornal impresso, por exemplo.
Portanto, ficou patente que a situação vivenciada pelo condomínio, localizado em Vinhedo, em nada se assemelharia ao caso examinado pelo STJ relativo ao condomínio localizado no sul do país. Assim sendo, caiu por terra a justificativa para imposição de multas pelo condomínio paulista.
É possível verificar que o magistrado ratificou a importância do conhecimento de todo o contexto fático de cada comunidade representada por condomínio que pode ter a finalidade residencial e/ou comercial, exemplificando o aspecto da localidade do imóvel, se em grande centro urbano ou se no litoral, e em local de forte atividade turística ou mesmo próximo de hospitais.
Por certo que o exame da questão da licitude da locação de curtas temporadas em condomínio residencial deve ocorrer dentro do panorama daquela comunidade e se existe algo expresso na convenção que corresponde ao regramento máximo do condomínio.
O peso da vontade da maioria
Para melhor demonstrar a linha de raciocínio do julgador de São Paulo acerca do peso máximo da vontade coletiva do condomínio, elencamos alguns trechos importantes da decisão:
(…)
Conclusão
É preciso entender o contexto dos julgados antes de sair verbalizando que isso ou aquilo está proibido! E mais, o cuidado deve ser redobrado quando se busca fundamentar uma multa (que é uma das maiores penalidades aplicáveis para infrações condominiais) em uma decisão judicial.
As sanções devem ser aplicadas, unicamente, com base na lei e na convenção, podendo, de forma exemplificativa, se valer de julgados para fortalecer a argumentação por trás do ato de punir.
A decisão do STJ pode sim servir de precedente para que condomínios residenciais concluam pela proibição dos condôminos de colocarem seus imóveis para locação a terceiros em situações que os transformem em verdadeiros albergues ou locais de hospedagens, via anúncios em plataformas digitais ou impressos em jornal. Independentemente disso, podemos ainda esperar grandes discussões nos tribunais até que a questão da locação por curta temporada, sobretudo por aplicativos e que tragam alta rotatividade, seja regulamentada pelo Poder Legislativo e tenhamos uma posição.
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¹ Processo nº 1002020-75.2021.8.26.0659
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