Entreguei meu carro no valet, mas era fraude e me roubaram! O seguro vai indenizar?

Contextualizando o cenário exposto no título, imagine a seguinte a situação:

Você vai a um restaurante, que também pode ser um buffet, uma balada, um teatro, enfim, qualquer estabelecimento comercial e, neste local, que normalmente se oferece um serviço de manobrista/estacionamento, você acaba entregando o seu veículo para uma pessoa que se identificou como manobrista do local.

Pois bem, após terminar os seus afazeres neste local, você procura os responsáveis para buscar o seu veículo e tem a infeliz surpresa de que o seu carro foi furtado, isto é, que o local não oferece o serviço de estacionamento de veículo, que desconhece a pessoa que recebeu o veículo, enfim, que você perdeu o seu carro!

Passado esse lamentável episódio, você procura se tranquilizar, imaginando que dos males o menor, pois você tem seguro veicular e será indenizado pela seguradora.

Todavia, mais um capítulo do pesadelo!  

A seguradora nega a indenização por ausência de cobertura!

Seu mundo certamente deve ter ruído neste momento. Mesmo após todas as tentativas realizadas por você e pelo seu corretor de seguro para tentar contornar a situação.

Criado esse contexto todo, adiantamos que a decisão da seguradora na grande maioria das vezes está correta, isto é, que a cobertura da apólice não abrange situações de furto mediante fraude, estelionato e apropriação indébita.

Costumeiramente, nos contratos de seguro veicular há um tópico destinado às excludentes de cobertura, que são situações nas quais a seguradora não terá o dever de indenizar acaso tal previsão venha a ocorrer.

Ainda que o consumidor final do seguro não tenha aptidão e condições para distinguir pequenas diferenças conceituais e técnicas que o colocam em risco, como por exemplo, imaginar que o seguro contratado cobriria toda e qualquer situação de furto e roubo, todavia, em uma situação como a exposta no início deste artigo, não teria qualquer cobertura, o contrato foi expresso ao prever as situações que limitam a responsabilidade da seguradora.

Este é o entendimento do Poder Judiciário, em especial, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Abaixo listamos alguns exemplos de casos reais:

• Ação de cobrança combinada com indenização por danos morais e materiais. Contrato de seguro de proteção de veículo automotor. Furto mediante fraude do automóvel objeto da proteção contratada. Cláusula contratual que afasta a cobertura na hipótese. Ré que negou a cobertura do sinistro somente após receber o documento único de transferência e a chave reserva do veículo (DUT). Termo de quitação de indenização enviado à ré previamente à negativa de cobertura. Conduta que viola o dever de lealdade e boa-fé. Criação de legítima expectativa. Danos morais configurados. Cobertura do sinistro, contudo, é indevida. Natureza consumerista da relação que não tem o condão de expandir indevidamente o âmbito de cobertura securitária. Dever de informação devidamente observado pela seguradora no contrato. Sentença mantida. Recursos não providos. (TJSP, Apelação nº 1008581-12.2022.8.26.0100, Data do julgamento: 04/07/2023)

• APELAÇÃO. COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. SEGURO FACULTATIVO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. SUBTRAÇÃO DO AUTOMÓVEL. Segurada que, ludibriada por indivíduo que se apresentou como segurança do local onde compareceu para realizar uma prova de concurso público, entregou a ele voluntariamente a chave de seu veículo. Configuração, em tese, do crime de estelionato, e não de furto mediante fraude. Risco expressamente excluído da cobertura. Cláusulas limitativas redigidas de forma clara e com destaque. Indenização não devida. Precedentes do E. TJSP. Sentença reformada. SUCUMBÊNCIA. Inversão do ônus. RECURSO PROVIDO. (TJSP, Apelação nº 1000585-86.2021.8.26.0523, Data do julgamento: 08/12/2022)

• Seguro facultativo de veículo. Ação de reparação de danos morais e patrimoniais. Autor vítima de estelionato. Veículo segurado vendido a terceiro e pago por meio de cheque não compensado. Recusa da seguradora em pagar a indenização por alegada ausência de cobertura para estelionato. Ação julgada improcedente. Apelação do autor. Cláusula que limita a cobertura a furto, roubo, incêndio e colisão. Autor vítima de estelionato. Seguradora que está obrigada a cobrir somente os riscos predeterminados (art. 757, do CC). Contrato de seguro que possui interpretação restritiva. Ausência de abusividade da cláusula mencionada. Sentença mantida. Recurso improvido. (TJSP, Apelação nº 1026060-54.2014.8.26.0405, julgado em 15/08/2019)

Concluindo, fica o alerta para você leitor! Tome muito cuidado na hora de entregar o seu veículo em um serviço de valet parking, pois, a depender da situação, você acabará sendo vítima e o seguro não o indenizará.

E caso tenha acontecido com você, consulte sempre um advogado e exponha a situação de forma detalhada. Não é sempre que as seguradoras estão corretas ao negar a indenização, mostrando o quão é importante analisar detidamente os termos do contrato e sua aplicação ao caso concreto.