Mesmo não militando na área do Direito Penal, alguns amigos e clientes perguntaram minha opinião sobre a recente decisão do STF, entendendo que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado (fase do processo em que não cabe mais recurso) e que a execução provisória da pena (a prisão) fere o princípio da presunção de inocência enquanto houver recurso pendente.
Ora, do ponto de vista jurídico, o tema não é tão complicado!
Por ser operador do Direito, cabe a mim a análise técnica, sem viés político, ideológico ou passional. Vou me limitar a um exame eminentemente jurídico sobre esse assunto, decidido em apertada votação perante nossa Corte Suprema.
Vamos aos fatos: o artigo 283 do Código de Processo Penal dispõe:
“ninguém poderá ser preso senão em decorrência de sentença penal condenatória transitada em julgado”.[i]
Já o inciso LVII do artigo 5º da nossa Constituição Federal afirma que:
“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.[ii]
Assim, é claro que nosso ordenamento jurídico privilegia o Princípio da Presunção da Inocência, ao determinar que, salvo nos casos de prisão temporária ou prisão preventiva, a prisão é admissível somente após decisão condenatória definitiva, ou seja, sobre a qual não mais caiba recurso.
Diante dessas colocações, que caminham para a conclusão de que a decisão do STF foi tecnicamente correta é natural que os leigos perguntem:
As respostas são, basicamente, duas: os entendimentos no Direito são dinâmicos. É habitual a mudança de opinião frente a uma determinada tese, como também, por evidente, o julgamento dessa questão teve natureza nitidamente política, o que não deveria acontecer, uma vez que, como magistrados os Ministros têm o dever legal de julgar com imparcialidade.
Direitos assegurados
Uma das funções do STF é assegurar nossos direitos e garantias fundamentais. Na minha modesta opinião, a decisão em questão simplesmente reiterou o que dizem a Constituição Federal e a Lei Federal.
Por certo não traz conforto à Sociedade saber que o julgamento do STF pode viabilizar a liberdade para inúmeros condenados que cumprem pena. Por outro lado, é no mínimo razoável que a Corte Máxima, guardiã da Constituição Federal do Brasil, faça valer o que ela própria determina. Se o Texto Constitucional não guarda coerência com o sentimento de Justiça que os cidadãos têm, urge que o sistema seja revisto a fim de refletir os anseios da coletividade, que não suporta mais injustiças!
Admitir que a prisão ocorra para o cumprimento de pena antes do término do devido processo legal, exceção às hipóteses de prisão temporária ou preventiva, significa relativizar o direito à liberdade, garantia que nos é fundamental. E a relativização da liberdade pode abrir perigoso precedente para o desrespeito a outros direitos e garantias fundamentais como a propriedade, a privacidade e a igualdade, dentre outras.
Concluindo, independentemente de quem a decisão do STF beneficiou ou venha a beneficiar, me parece coerente que a leitura da situação deixe claro que a Constituição foi respeitada.
Cabe à Sociedade pressionar o Poder Legislativo para que o sistema legal todo seja alterado, começando por uma reforma processual que suprima o sem número de recursos cabíveis, possibilitando que a prestação jurisdicional seja mais rápida, efetiva e justa.
Dado o contexto e repercussão do caso, acredito que como “justa” a Sociedade entende a possibilidade de que condenados a partir de provas irrefutáveis cumpram suas penas, mesmo enquanto aguardam o julgamento dos recursos permitidos por lei.
Qual sua opinião sobre nossos legisladores alterarem as leis
para viabilizar a prisão após condenação de segunda instância?
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[i] CPP – Art. 283: Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.
[ii] CF – Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
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