A pandemia causada pelo Coronavírus (Covid-19) tem gerado forte turbulência para as relações contratuais, bem como abalado muitos princípios constitucionais e legais que sempre balizaram os contratos. Um dos mais impactados é o de relação de emprego.
Praticamente a cada dia novas normas direcionando as relações trabalhistas são editadas em caráter de urgência pelo Poder Executivo, a fim de combater os prejuízos causados pelo isolamento social e quarentena imposta pelos prefeitos e governadores de cada localidade, além da determinada pelo Presidente da República.
Essas ações têm sido nefastas para a saúde financeira da sociedade, com exceção de poucas atividades “privilegiadas” pela pandemia como mercados, farmácias, fabricantes de álcool em gel, descartáveis médicos e seus insumos, dentre outras.
A Medida Provisória nº 936, sancionada no dia 1º de abril de 2020, que criou o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda foi uma das últimas determinações do Poder Executivo Federal, dispondo sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública.
Dentre as disposições está a possibilidade de redução salarial e da jornada de trabalho de forma proporcional, nas faixas de 25, 50 e 70%, pelo período de até 90 dias.
A medida é constitucional ou não?
Analisando friamente nossa Constituição Federal, notamos que seu texto é claríssimo ao impor que a redução salarial só pode ser efetuada através de convenção ou acordo coletivo:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
Em outras palavras, a redução salarial só pode ser realizada com a intervenção do sindicato representativo da categoria daquele setor. Significa que não havendo participação do ente sindical, a redução é irregular e o salário será devido na integralidade.
Entretanto, trazendo à tona a situação calamitosa ocasionada pelo Coronavírus (Covid-19), acreditamos que a garantia constitucional da irredutibilidade salarial precisará ser relevada e flexibilizada pelo Poder Judiciário, tal como várias outras garantias e direitos constitucionalmente assegurados.
Afinal, não podemos perder de vista que a medida provisória autorizando a redução salarial foi criada para a manutenção dos postos de trabalho, evitando demissões em massa por empregadores sem condições de suportar folhas de pagamento enquanto não faturam por causa do isolamento social determinado pelo Governo. Por essa razão, as medidas por parte dos empregadores demandam agilidade a fim de minimizar demissões.
Como esperar que sindicatos possam intermediar, em poucos dias, a análise de milhares ou milhões de acordos coletivos com a urgência que o momento impõe?
Certamente os sindicatos não conseguiriam retornar em tempo hábil. Além disso, demitiram muitos empregados e colaboradores, a fim de enxugar custos e permitir a continuidade de suas operações por ocasião da vigência da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017), que diminuiu a receita oriunda das contribuições sindicais. Portanto, neste momento de crise, análises e intermediações acabam se tornando morosas demais.
Na atual conjuntura devemos refletir e nos questionar sobre o que é melhor:
A resposta não é fácil e mostra-se muito subjetiva, pois, dependerá das condições de cada trabalhador. No entanto, pensando na coletividade, o Governo entendeu que a redução salarial proporcional ao tempo trabalhado é o remédio mais adequado para a sobrevivência de todos durante a crise econômica.
Diante desse panorama, o texto da medida provisória inovou e foi claro ao afirmar que o empregador poderá acordar novas condições salariais individualmente com o seu empregado, por escrito. A melhor solução é o acordo e não a imposição! Cabe ao empregado aceitar ou rejeitar a proposta do seu empregador.
Caso o empregado recuse a proposta, caberá ao empregador decidir se mantém o empregado nas mesmas condições ou se rescinde o contrato de trabalho, pagando todas as verbas rescisórias.
A escolha não será simples para qualquer dos lados, pois, nenhum está em condição saudável nesse momento. O bom senso deve reger as negociações para alcançar equilíbrio e manutenção das relações.
O posicionamento do STF
A propósito, o Supremo Tribunal Federal (STF), na pessoa do Ministro Ricardo Lewandowski, analisou em 06 de abril ação que questiona a constitucionalidade da aludida medida provisória.
No entender dele, acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho somente serão válidos se os sindicatos de trabalhadores forem comunicados em até 10 dias da celebração do acordo e se manifestarem sobre sua validade.
A ausência de manifestação do sindicato, na forma e nos prazos estabelecidos na legislação trabalhista (8 dias, nos termos do art. 617 da CLT), representa anuência com o acordo individual.
O tema será submetido a todos os demais Ministros da Suprema Corte e o entendimento do Min. Ricardo Lewandowski poderá ser confirmado ou não.
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