Recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo[1] sobre a ilegalidade da exigência de reparos em imóvel alugado para a aceitação das chaves pelo locador serviu para reforçar cuidados na locação.
São lições extraídas do resultado de ação para a declaração de rescisão de contrato de aluguel e consignação das chaves de imóvel movida por inquilinos contra locadores em Piracicaba, interior de São Paulo, em 2020.
Em linhas gerais, vencido o prazo contratual de trinta meses de locação, os locatários permaneceram no imóvel e o prazo se tornou indeterminado. Ao decidirem pela rescisão da locação, mediante a entrega das chaves, os inquilinos notificaram previamente os donos do imóvel para os trâmites finais.
Na vistoria começou o problema.
Alegaram os inquilinos que “a vistoria de saída foi realizada e o laudo de vistoria final foi enviado para o e-mail do requerente 2 dias depois” e “quando recebeu o laudo por e-mail, o locatário foi surpreendido ao constatar que o locador retornou ao imóvel no dia seguinte à vistoria (02/09) e a realizou novamente, certamente com chaves próprias e sem autorização para entrar no imóvel, além de estar desacompanhado dos locatários e dos fiadores, que sequer foram comunicados acerca dessa segunda vistoria, produzindo, assim, um laudo de vistoria final unilateral, com o qual os requerentes não concordaram”.
Com isso, os locadores se recusaram a encerrar o contrato sob o argumento de que seria necessária a realização de reformas no local.
Os inquilinos venceram a ação em primeira e segunda instâncias, sendo que o desembargador Flávio Abramovici apontou que os inquilinos comprovaram todos os requisitos previstos na lei e que foi “descabida a recusa dos requeridos ao recebimento das chaves, pois inexiste previsão legal de manutenção da relação contratual após o pedido de rescisão por parte do locatário”, fazendo com que o pedido de consignação das chaves fosse tido como correto.
O entendimento do Judiciário foi o de que não é lícito ao locador exigir a manutenção do vínculo locatício (recusa no recebimento das chaves, por exemplo) sob o argumento de que o imóvel não está em conformidade com o laudo de vistoria inicial. Eventual controvérsia acerca das condições do imóvel e de eventual indenização pelos prejuízos e pela indisponibilidade do imóvel durante período de reparo deve ser apreciada em ação própria.
Trocando em miúdos, a lei não autoriza que o locador injustificadamente se recuse a receber as chaves ou formalizar a rescisão da locação por entender que existem reparos a serem feitos pelo locatário.
Referido entendimento acende o alerta:
Após o contrato de locação, propriamente, que, de forma preferencial, deve ser escrito, o segundo documento importante e até solene é o laudo de vistoria, o qual deve ser realizado tanto no início quanto no final da locação. Adotamos a palavra solene pois, para trazer segurança deve seguir algum padrão mínimo, garantir transparência e ser o mais completo e fiel possível, se valendo de toda tecnologia disponível para fotos e vídeos.
Portanto, locatários e locadores devem dar muita atenção às vistorias e aproveitar o momento para fazer constar as exatas condições do imóvel, principalmente na vistoria final.
Evidentemente não se mostra razoável uma só parte comparecer na vistoria e entregar depois o laudo e a outra enviar alguém que não participou da vistoria inicial apenas para fazer constar sua presença.
O momento é sério e pode ter muitos desdobramentos!
A nossa recomendação: fique atento, seja você locador ou locatário, ao momento de fazer os laudos de vistoria inicial e final, de modo que possa ter um documento completo e referendado por ambas as partes. É importante que se possa comprovar que as partes estiveram juntas e assinaram o documento. É temerário cada um comparecer em um momento ou mesmo deixar para depois, sob o risco de receber a “conta final”, sem qualquer respaldo.
Outro ponto: muita atenção ao “singelo” protocolo de entrega das chaves do imóvel da locação, especialmente quando contiver menção à quitação de qualquer das partes ou mesmo recíproca.
Quitação deve ser dada apenas na certeza de que foi tudo averiguado e confirmado, seja no tocante à inexistência de pendências financeiras do imóvel, como gastos de consumo, quota condominial etc., seja no que se refere às condições do imóvel.
Aqui não cabe pressa, sendo um momento em que a assessoria de um advogado de confiança diminuiu muito as possibilidades de problemas!
[1] Apelação Cível nº 1018506-17.2020.8.26.0451 – julgamento 27/02/2023
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