Desde pequenos ouvimos dos nossos pais e avós que o nosso nome é um dos bens mais importantes que temos. Que devemos zelar por ele, mantê-lo ‘limpo’, honrando nossos compromissos para preservar nossa dignidade e honra.
Isso reflete exatamente o que estamos vivendo atualmente, afinal somos cada vez mais avaliados e “pontuados” pelo nome, na verdade, pelo CPF.
A exemplo do SPC e SERASA, são inúmeros os bancos de dados onde nossa situação de devedor ou credor é avaliada: Cadastro Positivo, Score, CADIN, Cartórios de Protestos, além dos órgãos públicos (estadual, federal e municipal) que emitem certidões e têm por objetivo avaliar nosso histórico de modo a dar publicidade das nossas restrições, dívidas, impedimentos e saúde financeira.
Erro na indicação do nome
Acontece que por vezes o credor erra ao fazer a inclusão do seu devedor junto aos órgãos de proteção de crédito. Nesses casos ocorre a chamada negativação indevida. Aquele que não tem nada a ver com a dívida ou que já pagou o que devia acaba sendo prejudicado pelo erro do credor, passando a ter seu nome “sujo na praça” indevidamente.
Dano moral
A negativação indevida pode causar abalo moral ao ofendido, vez que exposto publicamente à humilhação, sendo visto como pessoa que não cumpre com suas obrigações.
Ter o nome “sujo” geralmente causa restrição de crédito, além de provocar o recebimento de incômodas ligações telefônicas, cartas de cobrança, mensagens por WhatsApp e SMS.
Na visão do Poder Judiciário, esse constrangimento indevido decorrente de erro pode configurar dano moral. Trata-se do abalo que se presume sofrer a pessoa que tem sua honra injustamente ofendida, além dos sentimentos de dor, tristeza, vexame, humilhação, amargura, sofrimento, angústia e até mesmo depressão.
O reconhecimento do dano moral com a condenação do ofensor em indenizar o ofendido possui três funções: (i) compensar alguém em razão da lesão sofrida, (ii) punir o agente causador do dano e (iii) desestimular/prevenir nova prática de ato ilícito.
Legislação
A reparabilidade dos danos morais é relativamente nova no Brasil, tendo sido tornada pacífica com a Constituição Federal de 1988, pela previsão expressa no seu art. 5°, incisos V e X. Além disso, outras duas normas também protegem o cidadão. São elas, o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.
No Código Civil, podemos citar:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Já o Código de Defesa do Consumidor (CDC) assim estabelece:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Ainda, o CDC prevê o pagamento em dobro nos casos de cobrança indevida (art. 42, § único):
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Assim, a regra é que caso constatada inscrição indevida nos órgãos de proteção de crédito, o responsável pela indicação irregular deverá reparar o prejuízo moral.
Atenção! Exceção à regra da indenização por negativação indevida
Apesar da negativação indevida, se constatado que o indivíduo possuía apontamento legitimo anterior à negativação, isto é, que o seu nome já se encontrava “sujo na praça”, o Poder Judiciário vem entendendo que não será devida indenização por danos morais. Nesses casos, o entendimento é de que não houve abalo moral porque já havia negativações, conforme súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
Súmula 385
Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.
É importante destacar que o STJ flexibilizou o entendimento acima para permitir o reconhecimento de dano moral, ainda que as ações ajuizadas para questionar as inscrições anteriores não tenham transitado em julgado, desde que haja elementos suficientes para demonstrar que os apontamentos anteriores são igualmente indevidos e estão sendo discutidos em juízo.
Casos recentíssimos do TJSP envolvendo o tema:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C.C INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO – Alegação de indevido apontamento em cadastros de inadimplentes – Pretensão à exclusão da negativação, inexigibilidade do débito e danos morais – Sentença de parcial procedência – Recurso da autora buscando a condenação da ré pelos danos morais – Acolhimento – Inscrições anteriores que foram excluídas antes do apontamento realizado pela requerida – Inexistência de apontamentos ao tempo do ato ilícito praticado pela ré – Informação de órgão oficial constante dos autos – Danos morais configurados – Cerceamento indevido ao crédito – Lesão a honra, direito da personalidade – Valor de indenização fixado no montante de R$ 10.000,00 – Correção monetária a partir da publicação deste acórdão, ou seja, do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros moratórios a partir da citação – Disciplina da sucumbência revista – Recurso provido.(TJSP; Apelação Cível 1006500-61.2020.8.26.0003; Relator (a): Achile Alesina; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III – Jabaquara – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 16/09/2020; Data de Registro: 16/09/2020)
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS, FUNDADA EM CONTRATO QUE EMBASOU A RESTRIÇÃO DO NOME DO AUTOR EM CADASTRO DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. PREEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO APARENTEMENTE LEGÍTIMA. A NÃO DEMONSTRAÇÃO PELO APELANTE-AUTOR DA ILICITUDE DAS NEGATIVAÇÕES PREEXISTENTES E CONCOMITANTES AFASTA O DEVER DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS POR APONTAMENTO INDEVIDO EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO (SÚMULA Nº 385, STJ). RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1012512-83.2019.8.26.0405; Relator (a): Alberto Gosson; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Osasco – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/09/2020; Data de Registro: 14/09/2020)
Conclusão
Os tribunais entendem que aquele que já desfrutava de histórico creditício infeliz, não poderá alegar abalo em sua honra em razão da inscrição indevida. Porém, por certo terá garantido o seu direito à declaração da inexistência da dívida e qualquer outro desdobramento relevante que possa indicar a configuração de prejuízo.
Assim, respondendo à pergunta do título, depende, pois, nem toda inscrição irregular é capaz de gerar o direito à reparação por dano moral. Daí a importância de submeter o caso prático ao advogado de sua confiança para que ele possa avaliar a situação tendo como base, sobretudo, a legislação e o entendimento recente aplicável.
Você já foi negativado indevidamente ou conhece alguém que passou por essa situação?
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