Recente decisão do STJ determinou que o pagamento espontâneo de pensão alimentícia após o término dessa obrigação legal não gera um compromisso eterno. Referente julgado trouxe à tona um aspecto interessante das relações obrigacionais da nossa sociedade, não só tendo em vista aquelas decorrentes de parentesco.
No caso concreto, em ação de separação judicial, o ex-marido assumiu a obrigação de pagar alimentos à ex-mulher pelo prazo certo de 02 anos, no entanto, por conta própria, ou seja, por livre e espontânea vontade, manteve o pagamento por longos anos após o esgotamento do período inicialmente estipulado. Somente após totalizar 15 anos de pagamento de pensão alimentícia, isto é, 13 anos além do que fora pactuado, decidiu colocar fim ao seu gesto, interrompendo a paga alimentícia que vinha oferecendo há tempos.
O gesto movido por mera liberalidade criou dever?
A ex-mulher não concordou com a decisão do ex-marido e, com base na boa-fé, procurou sustentar a defesa do seu pretenso direito à manutenção da pensão, o que lhe foi reconhecido pelo tribunal estadual, no julgamento em segunda instância.
Portanto, respondendo à pergunta, para os magistrados da câmara do tribunal que julgou o caso, o ex-marido, ao pagar a pensão por longo período, de forma espontânea e graciosa, teria criado uma expectativa de direito que merecia a devida proteção jurídica.
Pois a obrigação é inexistente!
Ocorre que na instância superior o STJ alterou o entendimento do tribunal e, por maioria, entendeu que a boa-fé merece ser vista sob todos os ângulos da relação, com a preocupação central de não gerar o enriquecimento ilícito de uma das partes.
Segundo os ministros, o ex-marido estava certo e podia suspender o pagamento a qualquer momento, já que não havia mais obrigação entre as partes.
Em outras palavras, para a Corte Superior, a atitude solidária do ex-marido não teria sido capaz de criar um dever eterno para com sua ex-mulher, sem data para interrupção do pagamento.
Existem deveres eternos?
Dispensam-se maiores argumentos para sinalizar que o ‘eterno’ não existe, sendo que o Judiciário demonstra estar de olho nas alterações que ocorrem nas relações sociais, sobretudo, naquelas que interferem no campo das obrigações.
Vez ou outra no dia a dia nos deparamos com relações obrigacionais bastante longas, que beiram a perpetuidade, porém, não devemos perder de vista que direitos e obrigações são sempre pautados no acordo de vontades e/ou no que determina a lei.
Esperamos que a leitura desse artigo gere importante reflexão, não apenas no que diz respeito ao Direito de Família, como também às obrigações e aos contratos em geral. Vale lembrar que direitos e deveres, via de regra, têm um ciclo natural: nascimento, produção dos efeitos e fim. Essa sequência de acontecimentos merece ser respeitada, sendo a maior parte das obrigações legais e contratuais passageiras.
Tanto nas obrigações nascidas das relações familiares, quanto naquelas advindas dos negócios em geral, a assinatura de documentos estabelecendo regras e prazos demanda prévia e atenta análise das condições fixadas pelas próprias partes para que a comunhão de vontades assumidas não crie expectativas inexistentes para o Direito, tal como aquelas que pretendem vincular as partes para sempre.
Finalizando, ainda que determinada questão envolvendo direitos e deveres lhe pareça simples, entenda que consultar um advogado não é propriamente um gasto. Trata-se de um investimento capaz de lhe poupar dissabores e gastos futuros.
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