Matéria publicada pelo R7[1] informa que segundo dados disponibilizados pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a cada 36 minutos um passageiro é furtado ou roubado em metrô, trens ou ônibus no Estado de São Paulo. Para se ter uma ideia, somente entre janeiro e abril de 2023, 5.373 aparelhos celulares foram levados de usuários de transporte público no Estado de São Paulo.
Como se não bastasse a expressiva ocorrência de furtos (subtração sem violência) e roubos (subtração com violência ou grave ameaça), ainda segundo a matéria, os números não refletem a realidade com precisão e podem ser ainda maiores, pois muitas vítimas não registram boletins de ocorrência.
Entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo
Para esclarecer a dúvida referente à pergunta que intitula este artigo, adiantamos que a resposta não é das mais animadoras.
Para o TJSP, os serviços de transporte público têm responsabilidade objetiva (aquela que não depende de culpa) com relação à obrigação assumida de transportar passageiro em segurança ao seu destino.
Vejamos os principais fundamentos adotados pelos julgadores ao se analisar esse tipo de situação, por meio de caso real que chegou ao Poder Judiciário[2]:
“Em se tratando de contrato de transporte, a finalidade primordial no campo das obrigações da ré consiste em conduzir com segurança os seus usuários até o ponto final previsto em seu itinerário. Assim, sua responsabilidade existe com relação aos passageiros, e não em relação aos bens que cada um deles transporta consigo.
Por conseguinte, tem-se que a empresa ré não assume, no contrato de transporte, obrigação de garantir a incolumidade patrimonial de todos os seus usuários, pois tal situação não é inerente aos riscos do transporte em si, o que afasta sua responsabilidade na reparação por eventuais danos suportados pelos passageiros que são vítimas de crimes contra o patrimônio.”
Em outras palavras, verifica-se que no caso de roubo ou furto, a responsabilidade do fornecedor (transporte público) é afastada por se tratar de culpa exclusiva de terceiro pela subtração dos bens, sendo responsabilidade do Estado zelar pela segurança dos indivíduos.
Por fim, trouxemos alguns casos julgados recentemente pelo TJSP, que não reconheceram como dever do metrô indenizar passageiros que lá tiveram seus bens subtraídos.
APELAÇÃO. Transporte terrestre de pessoas. Ação indenizatória por danos morais e materiais. Subtração de celular nas dependências de estação de metrô. Falha na prestação de serviços pela concessionária não caracterizada. Excludente de responsabilidade. Culpa exclusiva de terceiro. Indenização indevida. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 252, do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça. Recurso improvido.
(TJSP; Apelação Cível 1023395-39.2023.8.26.0053; Relator (a): Flávio Cunha da Silva; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 19ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/05/2024; Data de Registro: 20/05/2024)
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DANO MORAL E MATERIAL – ROUBO DE CELULAR – Roubo de celular no interior de estação do Metrô – Fato praticado por terceiro, que representa caso fortuito externo, estranho à atividade da transportadora – Impossibilidade de exigir da empresa de transporte que evite tais situações, diante do elevado número de passageiros que diariamente utilizam os seus serviços – Inexistência de nexo de causalidade entre o evento danoso e o serviço prestado pela ré – Falha na prestação de serviço pela empresa ré não demonstrada – Sentença de improcedência da ação mantida – Recurso improvido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS – Aplicação do disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil – Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, majorados para 15% (quinze por cento), ressalvados os benefícios da gratuidade da justiça concedidos à autora. RECURSO IMPROVIDO.
(TJSP; Apelação Cível 1033547-45.2022.8.26.0001; Relator (a): Plinio Novaes de Andrade Júnior; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional I – Santana – 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/03/2024; Data de Registro: 26/03/2024)
“APELAÇÃO – AÇÃO INDENIZATÓRIA – CONTRATO DE TRANSPORTE – FURTO DE CELULAR – FATO DE TERCEIRO – DANOS MATERIAIS E MORAIS – I – Sentença de improcedência – Recurso do autor – II – Autor vítima de furto ocorrido nas dependências da empresa ré – O furto do qual foi vítima o autor é ato de terceiro que não implica em responsabilidade do transportador – Fato de terceiro que se equipara a caso fortuito externo, causa excludente de responsabilidade do transportador – Inexistência, no caso, de dissídio com a Súmula nº 187 do STF, que não é aplicável quando o ato de terceiro é equiparável, para o transportador, a caso fortuito ou de força maior, pela inevitabilidade do fato – Fato alheio à atividade da transportadora – Agir de terceiro que rompeu o nexo de causalidade entre a conduta da ré e o dano suportado pelo autor – Configurada exclusão de responsabilidade civil da transportadora – Indevido o pagamento de indenização a título de danos morais ou materiais – Ação indenizatória improcedente – Sentença mantida – III – Honorários advocatícios majorados, com base no art. 85, §11, do NCPC, para 15% sobre o valor atualizado da causa, observada a gratuidade processual – Apelo improvido.”
(TJSP; Apelação Cível 1003107-78.2022.8.26.0191; Relator (a): Salles Vieira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ferraz de Vasconcelos – 3ª Vara; Data do Julgamento: 20/04/2023; Data de Registro: 20/04/2023)
Verifica-se, portanto, que mediante interpretação e aplicação da lei o Poder Judiciário não vem responsabilizando os serviços de transporte público pelos crimes contra o patrimônio que vitimam os passageiros, haja vista que o reconhecimento da responsabilidade objetiva é restrito a determinados casos, guardando íntima relação com a garantia da incolumidade física do passageiro durante todo o trajeto. Tudo o que fugir deste contexto deve ser muito bem avaliado para se identificar, de fato, algum aspecto que permita imputar responsabilidade aquele que faz transporte público.
[1] https://noticias.r7.com/sao-paulo/um-passageiro-e-roubado-ou-furtado-a-cada-36-minutos-em-onibus-trens-e-metros-em-sp-25062023/
[2] TJSP – 1003107-78.2022.8.26.0191
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