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Entretanto, há um limite legal! O artigo 833, X, do Código de Processo Civil tem como objetivo proteger uma parte do patrimônio necessária para assegurar o mínimo existencial do devedor e sua família, o que se chama de “reserva”, em atenção aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade. Referido artigo dispõe que:
Art. 833. São impenhoráveis:
X – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos
A despeito do teor do artigo se restringir à poupança, já é pacífica a interpretação extensiva do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que a impenhorabilidade abrange, inclusive, conta-corrente e outras aplicações financeiras, até o limite de 40 salários-mínimos.[1]
No entanto, a Corte Superior faz a ressalva de que eventual abuso, má-fé, ou fraude por parte do devedor, deverá ser analisado caso a caso, de acordo com as circunstâncias da situação concreta.
É importante esclarecer que esta regra de impenhorabilidade não se aplica às pessoas jurídicas, ainda que a única conta mantida pela empresa seja a poupança. Isso porque a lei visa garantir e proteger a subsistência do devedor pessoa física e sua família.[2]
Mas o que acontece no caso de Empresa Individual, na qual o patrimônio da pessoa jurídica se confunde com o do respectivo empresário individual, pessoa física?
Nessa situação, o Tribunal de Justiça de São Paulo já se pronunciou em recentes decisões:
Agravo de instrumento – Execução – Pedido de desbloqueio de valores encontrados em conta bancária – Indeferimento – Executada que é cadastrada no CNPJ com natureza jurídica de “Empresário Individual” – Ausente distinção patrimonial da pessoa física, sendo certo que a inscrição no CNPJ é autorizada somente para fins tributários – Não havendo como dissociar o patrimônio da empresa ao da pessoa física, desnecessária, no caso, aferição da natureza dos valores bloqueados, diante da interpretação extensiva da regra inserta no inciso X do artigo 833 do CPC, à luz da garantia da dignidade da pessoa humana e da presunção da natureza alimentar, nos montantes inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos depositados em conta corrente, fundos de investimento e congêneres (Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.330.567/RS) – Precedentes – Impenhorabilidade reconhecida – Recurso provido (TJSP, Agravo de Instrumento 2121744-25.2023.8.26.0000, Relator(a): Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Órgão julgador: 19ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 22/09/2023, Data de publicação: 22/09/2023)
EXECUÇÃO Admissível o reconhecimento da impenhorabilidade prevista no art. 833, X, CPC/2015, para valores de até 40 salários mínimos, depositados em aplicações financeiras com caráter de investimento, incluindo contas-poupança vinculadas a conta corrente, fundos de investimento e conta corrente, ressalvada a possibilidade de penhora quando verificado abuso, má-fé ou fraude, no caso concreto, nos termos da orientação atual do Eg. STJ Manutenção da r. decisão agravada que deferiu o pedido de desbloqueio dos valores bloqueados, seja em nome da pessoa física ou em nome da empresária individual, porque: (a) inferiores a 40 salários mínimos (vigente no valor de R$1.320,00 à época dos bloqueios), nos termos do art. 833, X, CPC, ainda que somados aos valores já liberados à parte agravada, nos autos de origem e (b) ante o entendimento de que “empresário individual é a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus bens pelas obrigações que assumiu, quer civis quer comerciais”, (c) sendo certo que: (c.1) nada nos autos revela a ocorrência de abuso, má-fé ou fraude, no caso concreto e (c.2) desnecessário perquirir sobre as demais alegações da parte agravante, ante a existência de fundamento suficiente para embasar o desbloqueio das quantias em favor da parte agravante. (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2273315-43.2023.8.26.0000, 20ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 17/11/2023, Data de publicação: 17/11/2023)
Portanto, tendo em vista que a figura da empresa individual (pessoa jurídica) não existe dissociada do empresário (pessoa física), deve ser assegurado ao sócio e sua família um padrão mínimo patrimonial para sobrevivência, sendo aplicável a regra da impenhorabilidade, exceto quando houver prova contrária de que o bloqueio não compromete a dignidade da pessoa física ou a manutenção da empresa.
Concluindo, é possível notar que a leitura restrita do artigo legal citado não é suficiente, por si só, para o correto conhecimento do tema, haja vista os desdobramentos de sua interpretação no Judiciário. Nossa equipe busca atualização constante dos entendimentos judiciais de modo a ajudar você, leitor, na melhor compreensão da lei e suas consequências na prática.
[1] REsp 1.660.671/RS, STJ.
[2] https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/31012024-Pesquisa-Pronta-destaca-regra-de-impenhorabilidade-para-pessoas-juridicas-.aspx
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