Em 2017, quando ocorreu a Reforma Trabalhista por meio da Lei 13.467/2017, a Justiça do Trabalho foi surpreendida com um tabelamento das indenizações decorrentes de dano moral. A fixação dos valores correlatos a tais indenizações passou a se dar com base no salário da vítima, levando em consideração a gravidade do dano, de acordo com a seguinte classificação:
Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
1º Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I – ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II – ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III – ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV – ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
Conforme se pode notar pela leitura do artigo acima transcrito, a gradação do dano passou a seguir critério bastante subjetivo, sendo que seu enquadramento pode ser considerado de leve até gravíssimo.
Além disso, para cada tipo de dano, houve uma limitação máxima, sendo que, em se tratando de ofensa gravíssima, limitou-se um teto máximo de até 50 vezes o último salário da vítima.
Essa limitação criada pelo legislador gerou certa desigualdade para atos danosos da mesma natureza.
Como exemplo, podemos citar trabalhadores que sofreram acidente de trabalho e tiveram um braço amputado por culpa da empresa. Considerando-se que o salário de um trabalhador vitimado por tal acidente era R$ 2.000,00 e de outro era R$ 10.000,00, evidente que os valores recebidos pelos trabalhadores a título de danos morais seriam totalmente distintos para a mesma ocorrência. Diante dessa diferença salarial, a lei autoriza que as indenizações sejam completamente diferentes, o que não nos parece ser coerente.
É como se o braço amputado do trabalhador que recebe R$ 2.000,00 valesse muito menos do que o membro amputado do trabalhador que recebe R$ 10.000,00!
Ora, seguindo-se a norma ao pé da letra, injustiças poderiam ser perpetradas pelo próprio Poder Judiciário, em decisões com amparo legal.
Como o STF decidiu o tabelamento do dano moral?
Para procurar reverter essa possibilidade de injustiça, a partir de agora, o STF[1] orienta que o tabelamento das indenizações por danos morais trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deverá ser observado pelo julgador como critério orientador de fundamentação da decisão judicial.
Significa dizer que, tratando-se de uma orientação, é possível que, na prática, a fixação da condenação ocorra em quantia superior, desde que devidamente motivada.
O ministro Gilmar Mendes observou que, de acordo com a jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores, a lei ordinária não pode prever valores máximos de dano moral, seja no âmbito das relações trabalhistas, seja no da responsabilidade civil em geral. Contudo, a seu ver, a mudança legislativa não esvaziou, mas apenas restringiu a discricionariedade judicial a partir da listagem de critérios interpretativos a serem considerados na quantificação do dano.
Para ele, os parâmetros legais objetivos tal como o realizado é não apenas constitucional, mas desejável, na medida em que podem balizar o livre convencimento racional motivado do juiz. Por outro lado, o tabelamento impossibilitaria o magistrado de traduzir, de forma plena, a dor e o sofrimento da vítima em medida reparatória quantificável para além do teto estabelecido na lei.
Assim, ele entende que o magistrado deverá fazer uma interpretação íntegra do ordenamento jurídico brasileiro, podendo aplicar supletivamente aos casos trabalhistas o Código Civil, desde que não contrarie o regime da CLT.
Esse entendimento não foi unânime no STF, tendo os ministros Edson Fachin e Rosa Weber sustentando opiniões contrárias. Entendem eles que os dispositivos inseridos pela Reforma Trabalhista são inconstitucionais, uma vez que, as normas afrontam o princípio da isonomia, ao estabelecer, para o juiz trabalhista, limites não previstos para o juiz comum, isto é, para aqueles que não atuam na Justiça do Trabalho, na fixação das mesmas indenizações decorrentes de relações de outras naturezas.
Orientação aliada ao bom senso
Em conclusão, o STF passou a entender que os critérios de quantificação para a indenização por dano moral inseridos na CLT deverão ser observados pelo julgador como premissas orientativas de fundamentação da decisão judicial e que a fixação da indenização pode se dar em valor superior aos limites do dispositivo legal, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade.
[1] Processos: ADIn 6.050; 6.069; 6.082
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