Já escrevemos sobre a preocupação das empresas com as avaliações e relatos dos consumidores nas redes sociais, qualificações a elas atribuídas no Google e em sites específicos para reclamações, como o “Reclame Aqui”. O receio se justifica em razão do impacto negativo que uma opinião ruim pode trazer para a credibilidade da empresa no mercado.
No artigo anterior, focamos na imposição de cláusulas em contratos de prestação de serviços ou venda de produtos nos quais constava o dever do consumidor não avaliar a empresa ou não expressar sua crítica sobre o atendimento ou produto em redes sociais e sites em geral, sob pena de multa.
Agora, em razão da reportagem exibida em 28/08/2022 no programa dominical Fantástico sobre o golpe das passagens aéreas envolvendo a empresa TC Viagens e Turismo Ltda.[1], trazemos outro exemplo de tentativa de exclusão do direito de manifestação: a empresa estaria usando o Instagram como moeda de troca para pressionar um acordo[2].
No caso, os consumidores que levaram calote procuraram se concentrar em um perfil no Instagram chamado “prejudicados pela TC viagens” como forma de facilitar a comunicação e divulgação das ocorrências envolvendo o que reputam ter sido golpe. No dia da reportagem havia 600 seguidores, hoje[3] existem mais de 1.300 que apontam um prejuízo total de mais de R$ 1.000.000,00.
Em que pese algumas empresas se esforçarem para afastar esse direito genuíno e antigo, o fato é que a liberdade de que venha o consumidor externar a sua opinião e experiência nos veículos digitais é absoluta, sendo-lhe assegurado relatar com honestidade o que se passou com determinada empresa, devendo sempre fazê-lo com educação e respeito, sem incidir em crime contra a honra, tal como explicamos nesse artigo. Logo, eventual cláusula que busque trazer a exclusão de tal direito, sob pena de multa, deve ser tida como absolutamente abusiva.
Da mesma forma, reprovável a postura de pressionar o consumidor, vítima de golpe, a deixar de ser seguidor de determinado perfil.
Recentemente o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)[4] confirmou, por unanimidade, decisão de 1º grau que afastou o direito de empresa que alegou ter sido prejudicada por reclamação no “Reclame Aqui”.
A empresa que atua no ramo de portas automáticas ingressou com ação contra um cliente pedindo que ele retirasse a sua reclamação do site e fosse condenado a lhe pagar indenização por danos morais.
Reconheceu que o serviço foi defeituoso, porém, alegou que teria havido excesso no direito de liberdade de expressão do cliente, na medida em que solucionou o problema e teria amargado a desistência da contratação por novo cliente.
Na visão da juíza, o direito de manifestação e crítica foi exercido sem abuso, o que fez com que o comportamento do cliente fosse lícito. Além disso, o erro, a demora e a resistência da empresa para solucionar o vício no serviço foram muito bem demonstrados, embasando a insatisfação e razão do consumidor.
Aquele que oferta serviços e produtos está passível de ser alvo de comentários (positivos ou negativos), reclamações e relatos da experiência nas redes sociais, avaliações do Google e sites dedicados à proteção do consumidor.
São instrumentos bastante importantes e que oferecem muitos pontos positivos, trazendo transparência, segurança e exaltação dos bons prestadores de serviços. As empresas devem compreender que, mesmo que seja identificado um problema, a forma de solução e o bom atendimento para contorná-lo serão pontos positivos na sua avaliação.
A propósito, na reportagem do Fantástico mencionada no início desse artigo, foram indicados três cuidados contra golpes na venda de pacotes turísticos: (i) desconfiar de super promoções, (ii) verificar se a empresa tem cadastro no CADASTUR e (iii) pesquisar reclamações.
Ao final, os consumidores prejudicados disseram que não acreditam que o dinheiro será recuperado.
Acaso atendidas as condições por ela própria impostas, desconhecemos se a agência vem devolvendo ou vai restituir o dinheiro dos consumidores, mas esperamos que não surjam novos consumidores prejudicados pela empresa em questão, servindo o ocorrido como um alerta para a sociedade, potencializado pelo alcance do perfil criado na rede social.
[1] Agência de viagem acusada de calote só faria acordo com quem saísse de perfil de reclamações, dizem clientes | Fantástico | G1 (globo.com)
[2] “A TC está fazendo os acordos e pagando, só está reembolsando os clientes que sairam do insta… “prejudicados pela tc” se retirarem ou saírem a TC irá acertar de imediato”
[3] 14/09/2022
[4] Apelação Cível nº 1006653-36.2021.8.26.0011 – Data do Julgamento: 08/07/2022
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