A lei nº 8.009/90 considera como bem de família o único imóvel do devedor utilizado como residência (sua ou de familiares), sendo imune à penhora decorrente de qualquer tipo de dívida, observadas as exceções previstas na própria lei.
Assim, bem de família nada mais é do que uma garantia conferida por lei determinando que o imóvel residencial não responda por dívida, respeitadas as ressalvas previstas na lei.
Já abordamos o tema aqui no blog em outras oportunidades, valendo destacar os seguintes artigos:
Devo, não nego, mas a minha casa não pode ser penhorada!
Bem de família alugado ou oferecido como garantia em locação comercial pode ser penhorado?
Violação da boa-fé pode causar a penhora do bem de família.
Em quais situações o bem de família responde por dívidas?
Pois bem, conforme dissemos, a lei traz 5 EXCEÇÕES que autorizam a penhora do imóvel bem de família:
Como vemos, a lei não fala sobre a hipótese do imóvel que tem valor vultoso, isto é, com preço muito elevado.
O que vale para imóvel de valor alto?
Em primeiro lugar, valor vultoso ou elevado é algo subjetivo, pois, o que pode ser elevado para um, pode não ser para o outro.
Assim, se seguirmos literalmente o texto da lei do bem de família, notamos que não haveria relevância alguma no valor do imóvel ou quão luxuoso seja. Com isso, se estiver enquadrado na definição de bem de família acima transcrita, em tese, não haveria que se falar em penhora do imóvel.
Logo, um devedor poderia concentrar praticamente todo o montante do seu patrimônio naquele imóvel, pois estaria protegido dos seus credores.
Será mesmo que o Direito acobertaria isso?
Bem, parece que não! E a interpretação moderna se deve aos doutrinadores e julgados, conforme exemplo abaixo:
Semana passada, uma importante decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[1] sacudiu os alicerces da proteção ao bem de família o que deve ter deixado muitos devedores sem dormir.
O tribunal paulista autorizou a penhora parcial de imóvel avaliado em R$ 24 milhões, mesmo sendo destinado à moradia de um casal de devedores. O casal está sendo executado por dívida de mais de R$ 207 milhões.
Do valor total, os desembargadores determinaram que 10% serão impenhoráveis, garantindo quantia necessária à aquisição de outro imóvel que proporcione aos devedores nova moradia digna, haja vista a situação social em que vivem.
Abaixo transcrevemos breve trecho da decisão, com justificativas que deferiram a penhora parcial do bem de família dos devedores:
“Se a proteção conferida pela Lei nº 8.009/90 é a preservação de um patrimônio mínimo, visando à garantia de um mínimo existencial necessário para tornar efetiva a dignidade da pessoa humana, cumpre indagar se essa proteção se estende a um imóvel de valor declarado de R$ 24 milhões, valor que, por certo, suplanta o patrimônio total da grande maioria dos brasileiros. A resposta, à evidência, é negativa, já que nenhuma pessoa, ainda que integrante do topo da pirâmide econômica da sociedade, necessita de um imóvel nesse valor para a preservação de sua dignidade como pessoa humana”
A decisão ainda não transitou em julgado, ou seja, ainda é passível de recurso e, muito provavelmente, os devedores levarão o tema ao Superior Tribunal de Justiça, responsável por manter ou reformar seu teor.
Importante destacar que se trata de posicionamento minoritário, porém, denso e técnico, tendo bem amarrado importantes preceitos do Direito, inclusive, a análise da finalidade da lei que trouxe a proteção ao bem de família. De fato, abriu-se enorme precedente para outros julgados em situações semelhantes.
De todo modo, qualquer análise sobre a penhorabilidade ou não de um bem de família sempre dependerá de um caso concreto e do que os julgadores decidirão, algo que pode ser revisado por todas as instâncias do Poder Judiciário.
O que você pensa sobre a decisão?
Deixe o seu comentário.
[1] Agravo de Instrumento nº 2075933-13.2021.8.26.0000
Entre em contato conosco!