Antes de que nossos leitores tenham a resposta à questão que dá título ao artigo dessa semana, honrando nosso propósito de compartilhar conhecimento, importante uma breve indicação dos requisitos legais para que um inventário corra perante um Tabelião de Notas, isto é, adote a via extrajudicial, de acordo com a Lei 11.441/07, encerrando-se por escritura pública, em vez de adotar o tradicional e moroso processo judicial:
Da leitura dos requisitos acima, bem como, ao ler os termos da lei, correta a conclusão de que havendo herdeiros menores ou incapazes, é obrigatório o ajuizamento de inventário judicial.
Entretanto, o Direito é dinâmico e não raramente seus operadores produzem novos entendimentos frente antigas questões, de modo que, embora não tenha havido mudança na lei sobre a necessidade de se adotar a via judicial em inventários em que há herdeiros menores, já são encontradas exceções aos dizeres da lei, conforme se pode verificar nas decisões judiciais divididas em correntes divergentes do tribunal paulista (TJSP) indicadas abaixo.
Para a primeira corrente, que é a predominante, havendo menores é imprescindível a realização do inventário judicial, por se tratar, acima de tudo, de observância à lei. Ademais, as demandas que envolvem menores necessitam da intervenção do Ministério Público, nos termos do artigo 178, inciso II do Código de Processo Civil, para proteger seus interesses.
Já para a segunda corrente, que é a minoritária, pode, excepcionalmente, haver inventário extrajudicial com herdeiro menor, desde que autorizado por alvará judicial. Para tanto, deve-se fazer uma divisão igualitária dos bens entre os herdeiros a fim de não prejudicar o incapaz. Esta linha de entendimento enfatiza a celeridade do inventário extrajudicial e o atendimento aos anseios dos herdeiros, favorecendo a redução das demandas judiciais distribuídas. Logo, apesar do parecer contrário do Ministério Público, entendeu-se por bem seguir com a autorização para o inventário extrajudicial com herdeiro incapaz.
Na linha da segunda corrente, na sentença de procedência, confirmada em grau de recurso pelo Colegiado do TJSP, o juiz ponderou:
“o ponto a ser superado é o resguardo do direito da pessoa incapaz, o qual entendo que é possível de ser alcançado desde que o inventário extrajudicial opere com a observância dos seguintes elementos:
1) a partilha sobre a propriedade imobiliária deverá ocorrer de maneira igualitária entre os legítimos herdeiros, mantendo-se o bem em condomínio e eventual alienação do quinhão do(s) incapaz(es) somente poderá acontecer se autorizada judicialmente (…);
2) em havendo a partilha sobre bem móvel (veículos de propriedade do autor da herança) deverá ocorrer de maneira igualitária (…);
3) havendo valores em contas bancárias, o quinhão do herdeiro incapaz C. S. M. (1/12), incluindo-se aplicações financeiras ou resíduos previdenciários em nome do de cujus deverá permanecer depositado em conta judicial vinculada ao presente feito e somente será levantado mediante autorização judicial, ouvido o Ministério Público, condicionada à prestação de contas (…)”
Outro ponto de extrema relevância, decorrente desta decisão diz respeito ao critério para cálculo das custas judiciais.
Referida sentença, embora tenha autorizado a expedição de alvará para realização de inventário extrajudicial, determinou o recolhimento da taxa judiciária com base no valor do patrimônio deixado pelo falecido, sem que de fato tenha ocorrido o inventário judicial para tal cobrança. Em grau de recurso, o colegiado do TJSP sabiamente reformou a decisão, evitando-se o pagamento em duplicidade, conforme ementa do acórdão abaixo destacado:
“ALVARÁ JUDICIAL – Autorização de celebração extrajudicial de inventário, mesmo com a presença de herdeiro menor – Pedido aceito, atendidas as condições estabelecidas na sentença – Insurgência dos autores – Alegação que a sentença os condenou ao pagamento de custas de 100 UFESP’s, mas o caso não se enquadraria no dispositivo da Lei Estadual nº 11.608/2003 invocado na sentença – Cabimento – O recolhimento da taxa judiciária será devido “Nos inventários, arrolamentos e nas causas de separação judicial e de divórcio, e outras, em que haja partilha de bens ou direitos” – Inteligência do art. 4º, §7º, da Lei de Regência – Partes que ingressaram diretamente com pedido de alvará com o intuito de iniciar o inventário, desde o princípio, por via extrajudicial – Alvará que não tem por objeto, diretamente, a “partilha de bens e direitos”, não podendo incidir, sobre o caso, o dispositivo em questão – Custas que não podem ter relação com o patrimônio inventariado, que já será objeto da respectiva tributação pela via administrativa, sob pena de bis in idem – Precedente – Custas regularmente recolhidas, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei Estadual de Custas – Sentença reformada – RECURSO PROVIDO”
Por fim, vale destacar que no mês de abril deste ano foi entregue ao Senado Federal o Anteprojeto do Código Civil.
Para evidenciar a importância da questão em comento, dentre os temas discutidos por renomados juristas para a reforma do Código Civil, está a proposta de alteração do artigo 1796 no sentido de prever a expedição de alvará judicial para que o inventário, com herdeiro incapaz, seja levado a efeito extrajudicialmente, desde que não haja oposição do curador do incapaz nem conflito com o cônjuge ou convivente supérstite, conte com a concordância de todos os herdeiros e, por óbvio, do Ministério Público. Nos resta aguardar, entretanto, se haverá ou não a aprovação legislativa.
Desta feita, a equipe do nosso escritório está sempre atenta às novidades do Judiciário e do Legislativo com o objetivo de atualizar você, leitor, bem como, apresentar as melhores alternativas jurídicas disponíveis para atender aos interesses dos clientes.
Fontes:
Apelação Cível nº 1002777-22.2023.8.26.0361 – Mogi das Cruzes, Vito Guglielmi Relator, data julgamento: 11/05/2023
Apelação Cível Nº 1005662-34.2023.8.26.0482, Relator Miguel Brandi, data do julgamento: 11/10/2023
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