Você sabe o que é direito real de habitação?
É o direito do cônjuge ou companheiro sobrevivente de continuar morando no imóvel que serviu de residência para o casal, de forma vitalícia. Essa garantia independe do regime de bens, porém, no inventário dos bens deixados pelo falecido, deve ser o único imóvel em que convivia o casal, ainda que existam outros imóveis deixados pelo “de cujus”.[1]
Recentemente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou um caso[2] em que os filhos do falecido pediram a exclusão do direito real de habitação da viúva, alegando que ela possuía recursos financeiros para sua subsistência, uma vez que, recebia pensão integral do falecido que era procurador federal e tinha expressiva quantia na conta bancária. Dessa forma, ela teria condições de morar em outro imóvel de padrão semelhante ou até superior.
Alegaram, ainda, que além de se tratar do único imóvel a inventariar, diante da pequena diferença de idade entre a viúva e os herdeiros, eles teriam remota possibilidade de usufruir da propriedade.
A Ministra Nancy Andrighi explicou no acórdão que o direito real de habitação está calcado nos princípios da solidariedade e da mútua assistência, representando uma concretização da dignidade da pessoa humana.Em adição, que não se trata tão somente de um direito constitucional à moradia, mas também de um direito de ordem humanitária e social, haja vista a existência do vínculo afetivo e psicológico que o casal teve com o imóvel (seu lar) ao longo da convivência.
Por outro lado, a Ministra ponderou que o direito real de habitação não é absoluto. Analisando o caso concreto, havia um único imóvel a inventariar, de propriedade exclusiva dos herdeiros (nu-proprietários), sendo que a viúva possuía outros bens e uma situação econômica estável, o que lhe garantiria moradia e subsistência. Os herdeiros, por sua vez, alugavam outros bens para residirem com os seus descendentes (netos do falecido).
Nesse contexto, restou claro que os filhos herdeiros se encontravam prejudicados, em situação de vulnerabilidade.
Logo, em cenários como este, os doutrinadores já vêm, há longa data, em situações específicas e excepcionais, propondo a relativização do art. 1831, do Código Civil, que estatui o direito real de habitação.
Compartilhando dessa linha de entendimento, por unanimidade, no caso prático, os Ministros afastaram o direito real da viúva em prol dos direitos sucessórios dos filhos herdeiros. Portanto, o direito de propriedade dos herdeiros prevaleceu sobre o direito à moradia da viúva. Como se pode notar, a análise individual de cada caso e a ponderação dos contextos e direitos de cada parte são de suma importância para uma decisão equilibrada e harmoniosa, haja vista que a intepretação literal da lei, por vezes, pode ir na contramão da Justiça, o que nos pareceu ter sido garantida na situação concreta trazida.
[1] Art. 1831, CC: Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
E, ainda, REsp 1.582.178 – RJ.
[2] REsp 2151939/RJ (2024/0220696-4)
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